quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

Amigo imaginário


Quero-te de volta

Amanheceu como nos outros dias de dois mil em diante, aqui na casa da Clementina
Carolina, ou como eu lhe chamo, mãe. Preparava-me para mais uma descida ao inferno,
não por vontade própria, mas por obrigação. Vesti a camisola azul abrilhantada e as calças
de ganga novas dadas pela tia que vem cá de nunca em quando, se é que me faço
entender. Atei os ténis, peguei nas chaves para dar à mãe e desci as escadas para tomar o
pequeno-almoço em menos de um minuto, que, igualmente aos outros dias, acabou por
demorar mais de cinco minutos! A minha mãe começou a gritar:
- Zélia Maria, já não apanhas o autocarro outra vez! Agora tenho de te levar lá!
Achas isto bem!?!?
Os meus ouvidos entupiram, as minhas pernas bloquearam.
- Não quero ir, ponto final e não há parágrafo!
Simplesmente não gostava da escola... Não era pelos professores, não era pelas
instalações... era por aquilo que os meus colegas pensavam de mim!
Bem, de qualquer maneira tinha que me dirigir aos aposentos da professora Camélia
Abélia.
Já mais despertada, entrei no carro da mãe e fomos a “correr” para a escola.
Quando dei conta, o DB não estava na mala! Mas... eu pensava que o tinha colocado
lá ontem! Ou será que não? Ah, já sei... Deve ter ficado na almofada! Não acredito! Ontem
estive até às dez a falar com ele, e depois esqueci-me de o guardar... Tinha de voltar para
trás!... Não aguentava um dia com ele longe de mim!
Peço desculpa, esqueci-me completamente de apresentá-lo: o DB é o meu melhor
amigo, mas não achem estranho... ele é um dicionário mais inglês que português, no
entanto percebe os dois. Se o conhecerem bem, vão ver que ele até é muito simpático!
Voltando ao carro:
- Mãe, tenho de voltar a casa! Esqueci-me do DB!
- Nem penses, Zélia! Já estou a caminho e agora nem sequer vou olhar para trás!
- Ai é!? Então vou suster a respiração até mudares de ideias...!
- Não faças isso! Arghh, está bem... depois eu peço ao teu pai para to trazer à
escola...
Soltei um suspiro interminável. Já estava MUITO mais descansada...
Cheguei à escola. Dirigi-me para a minha sala e, claramente, via-se que estava
atrasada... muitíssimo atrasada... Estava tudo a olhar para mim. Entrei e sentei-me no meu
lugar. Era demasiada pressão para mim... a transpiração escorria por todos os lados... Mas,
naquele preciso momento, consegui ouvir ao longe o DB:
- Relax, just relax!
Fiz o que ele disse e abri a lição. Já o sentia perto, bem perto.
Daí a uns minutos apareceu a D. Ana, voz de cana, com o DB na mão. Pegava-lhe de
uma forma que lhe fazia doer a lombada, mas, naquele momento, só o queria reaver e
nunca mais o largar! Ele estendia-me as folhas e eu estendia-lhe os braços... Parecia
mesmo o filme do Shreck e da Fiona.
- Are you ok, my little DB?- disse-lhe eu com as lágrimas nos olhos.
- Yeah, I'm fine. Nãao te preocupes comigo!
- Os meninos não param de olhar. What should I do?
- Ignora-os. Se eles não querem ser teus amigos, não ligues ao que dizem ou
fazem. Eles não sabem what they lose!
- Thank you, DB!
- Welcome!
Devemos ter falado muito alto... os meus colegas começaram-se a rir e a segredar
entre eles, olhando para nós, mas, como o DB disse, “ignora-os”.

Liliana Nunes

Imagem in
http://asingularvidadebrunoaramaki.blogspot.pt/2011/01/amigos-imaginarios.html [consultado em 29-12-2016]

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